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segunda-feira

O juiz mais ameaçado do país vai se aposentar

Odilon de Oliveira chega a Justiça Federal no começo de março (Foto:  Emiliano Capozoli)Sob o risco de perder a proteção após 18 anos, Odilon de Oliveira cogita virar político ou se mudar para a Romênia.
O juiz federal Odilon de Oliveira destranca uma gaveta de documentos sigilosos e retira um livro de capa dura preta, com letras douradas. O ar condicionado congelante de sua sala ameniza os 37 graus de temperatura em Campo Grande naquela tarde de sexta-feira. No calhamaço de quase 300 páginas, escrito e encadernado por ele, Odilon guarda uma compilação de provas e memórias das ameaças de morte mais bem arquitetadas que sofreu em seus 30 anos na magistratura federal. “Esse seboso aqui eu condenei”, afirma, sem esconder o orgulho, depois de deslizar o dedo pelo sulfite e parar no nome de um dos traficantes.

Folheia a obra com agilidade e aponta mais um, depois outro e mais outro – e assim se alonga por mais de uma hora, revisitando as histórias de cada um de seus algozes que acabou por prender. Ao cruzar com um bilhete embalado num plastiquinho e grampeado numa folha – uma ameaça do traficante Jorge Rafaat Toumani, na época considerado o “rei da fronteira” –, apressa-se: “Está vendo aqui? A vagabundagem me chama de Odi”, diz, mostrando seu apelido no papel. “O cabra escreveu de próprio punho e mandou me entregar. Naquela época, minha cabeça valia só uns R$ 500 mil. Eu ainda era barato.” Solta uma gargalhada.
Aos 68 anos recém-completados, doutor Odilon, como todos o conhecem, é um dos mais temidos juízes brasileiros que trabalham no combate ao narcotráfico. Sua trajetória profissional coleciona condenações dos mais influentes traficantes de drogas com atuação na fronteira do Brasil com o Paraguai e a Bolívia. Mandou prender o carioca Luiz Fernando da Costa, o Fernandinho Beira-Mar. E o paranaense Luiz Carlos da Rocha, o Cabeça Branca, considerado pela Polícia Federal o maior narcotraficante internacional do país.
Em suas três décadas como juiz federal, Odilon não só colocou na cadeia algumas centenas de criminosos, como também esvaziou as contas bancárias das quadrilhas. “Se você só prende, os bandidos continuam mandando lá de dentro e, quando saem, usufruem de tudo aqui fora. Se você confisca os bens, dá um duro golpe na espinha dorsal da organização. Ela fica sentada no chão como um João Sem Terra, não se levanta nunca mais”, afirma. Confiscou 282 imóveis do crime, 761 veículos e 27 aeronaves – parte deles vendida em leilões por um total de R$ 27 milhões. Seu legado como juiz, entretanto, ficará por aqui.
No final de fevereiro, Odilon anunciou no Facebook que vai se aposentar. Pediu a contagem do tempo de trabalho e agora espera o término do trâmite, previsto para meados de setembro. “Já queria ter parado há uns dois anos, mas preciso antes resolver minha segurança. Se sair na rua sozinho, tomo uma surra de porrete”, diz. “Virei refém da toga.” Odilon é o único juiz do Brasil que conta com uma operação permanente da Polícia Federal (PF). Há 18 anos, é acompanhado 24 horas por dia, sete dias por semana, por uma escolta armada com pistolas e submetralhadoras. Sua casa é monitorada por câmeras de segurança. O carro que usa, um SW4 prata, tem uma blindagem que suporta tiros de fuzil. Assim que parar de trabalhar, Odilon deverá perder todo esse aparato. A portaria do Ministério da Justiça que trata da segurança de autoridades, de 8 de janeiro de 2001, não menciona casos de aposentadoria. Procurada, a PF afirmou que ainda não tem uma definição sobre esse caso.

Fonte: O Globo

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